O sofrimento é um estado de inconsciência.
Sofremos porque não estamos conscientes do que fazemos, do que pensamos, do que sentimos — por isso, estamos nos contradizendo o tempo todo. As atitudes vão numa direção, os pensamentos em outra, os sentimentos sabe-se lá para onde.
Continuamos a nos estilhaçar, a ficar cada vez mais fragmentados. Isso é que é sofrimento — perdemos a integração, a unidade. Ficamos totalmente sem centro, somos mera periferia. E é claro que uma vida sem harmonia torna-se miserável, trágica, um fardo que temos de carregar de algum jeito, um martírio.
[...]
Só existem duas formas para escapar disso: praticar meditação — ficar alerta, atento, consciente... o que não é nada fácil. É preciso garra.
O jeito mais barato é encontrar algo que deixe a pessoa ainda mais inconsciente do que já está, para que assim ela não consiga perceber a miséria em que vive. Encontre algo que o torne totalmente insensível, alguma coisa tóxica, algum analgésico que o deixe tão inconsciente que você possa mergulhar de cabeça nessa inconsciência e esquecer a ansiedade, a angústia, a falta de sentido.
A segunda opção não é o caminho verdadeiro para se livrar do sofrimento. Ela só faz com que esse sofrimento fique um pouco mais confortável, um pouco mais tolerável, mais conveniente. Mas isso não ajuda em nada — isso não transforma você.
A única transformação acontece por meio da meditação, porque esse é o único método que torna você consciente. Para mim, a meditação é a única religião de verdade. Todo o resto é embromação.
E existem diferentes combinações de ópio — Cristianismo, Hinduísmo, Maometismo, Jainismo, Budismo —, que não passam de combinações diferentes. A forma é diferente, mas o conteúdo é o mesmo: todos eles ajudam você de alguma forma a se conformar com o sofrimento.
Minha intenção aqui é levar você a superar o sofrimento. Não há por que se conformar com ele; existe uma possibilidade de você se ver livre desse sofrimento. Mas o caminho é um pouquinho mais pedregoso; é um desafio.
Você tem de ficar consciente do seu corpo e do que está fazendo com ele...
[...]
Nos tribunais, muitas vezes os acusados negam veementemente que tenham assassinado alguém. No início, o mais comum é que se pense que eles estejam simplesmente mentindo, mas depois descobre-se que não se trata disso; os acusados cometeram o crime num estado de profunda inconsciência.
Estavam tão furiosos, com tanta raiva no momento do crime, que foram tomados por essa fúria. E, quando você está furioso, seu corpo produz toxinas que contaminam o sangue. Quando está encolerizado, você é vítima de uma loucura temporária. E a pessoa acaba se esquecendo totalmente disso, porque estava totalmente inconsciente do que fazia.
E é assim que as pessoas se apaixonam, matam umas às outras, suicidam-se, fazem todo tipo de coisa.
O primeiro passo para ficar consciente é sempre prestar atenção ao próprio corpo.
Bem aos poucos, você começa a ficar atento a cada gesto, a cada movimento. E, à medida que fica consciente, um milagre começa a acontecer: muitas coisas que costumava fazer você simplesmente não faz mais.
Seu corpo fica mais relaxado, começa a ficar mais sintonizado, uma paz profunda começa a invadir todo o seu corpo, uma música sutil pulsa dentro de você.
Então você começa a se dar conta dos seus pensamentos — o mesmo tem de ser feito com relação a eles.
Os pensamentos são mais sutis que o corpo e, evidentemente, mais perigosos também. Quando se der conta dos seus pensamentos, você ficará surpreso com o que se passa dentro de você.
Se tomar nota de tudo o que está passando pela sua cabeça agora, você vai ficar muito surpreso. Não vai nem acreditar — "Estou pensando nisso tudo?" Experimente tomar nota de tudo por dez minutos. Feche as portas, tranque portas e janelas para que ninguém possa entrar, e então seja absolutamente honesto — e vá acendendo logo o fogo para que possa queimar esse papel! — assim ninguém mais ficará sabendo o que você pensa. Mas seja bem honesto; escreva tudo o que passar pela sua cabeça. Não interprete nada, não mude nada, não comece a pôr nada em ordem. Simplesmente coloque os pensamentos no papel da forma como eles vierem, sem mudar uma palavra.
E, depois de dez minutos, leia o que escreveu — você verá que existe uma mente insana aí dentro! Você não se dá conta de toda essa loucura que passa continuamente pela sua mente como uma corrente subterrânea. Essa loucura afeta tudo o que é importante na sua vida. Ela afeta qualquer coisa que você faça; afeta qualquer coisa que deixe de fazer, afeta tudo. E a soma total disso tudo vai ser a sua vida!
Portanto, esse louco precisa mudar. E o milagre da consciência consiste no fato de que você não precisa fazer nada a não ser tomar consciência. O próprio fenômeno de observar esse louco vai fazer com que ele mude. Muito lentamente, esse louco dentro de você desaparece.
Bem devagar, os pensamentos começam a seguir um certo padrão: esse caos deixa de ser um caos e torna-se mais um cosmo. E, então, mais uma vez prevalece uma profunda paz.
E, quando o seu corpo e a sua mente estiverem em paz, você verá que eles também entram em sintonia; surge uma ponte. Agora eles não correm mais em direções opostas, não cavalgam cada um no seu cavalo.
Pela primeira vez na vida, existe um acordo, e esse acordo é extremamente útil para que se dê o terceiro passo, ou seja, tomar consciência dos sentimentos, das emoções e dos estados de ânimo.
Essa é a camada mais sutil e mais difícil, mas, se você conseguir tomar consciência dos seus pensamentos, só faltará mais um passo.
É preciso uma consciência um pouco maior quando você começa a refletir sobre seus estados de ânimo, suas emoções, seus sentimentos.
Assim que você estiver consciente de todos os três, eles se unirão, formando um só fenômeno.
E, quando se tornarem uma coisa só, atuando juntos com perfeição, no mesmo ritmo, você conseguirá sentir a música de todos os três — eles virarão uma orquestra —, fazendo com que surja um quarto elemento, que não depende da sua vontade; ele surge espontaneamente, é uma dádiva do todo. Uma recompensa para todos que chegam até aqui.
Esse quarto elemento é a consciência definitiva que faz de você uma pessoa desperta.
Fica-se consciente da própria consciência — esse é o quarto elemento. Isso é o que faz de alguém um buda, um ser desperto. E é somente com esse despertar que a pessoa vem a saber o que é bem-aventurança.
O corpo conhece o prazer, a mente conhece a felicidade, o coração conhece a alegria, o quarto elemento conhece a bem-aventurança.
A bem-aventurança é o objetivo, e a consciência é o caminho que leva até ela.
Extraído do livro "Consciência: a chave para viver em equilíbrio"
domingo, 26 de agosto de 2012
quarta-feira, 15 de agosto de 2012
Poesia de Krishnamurthi
Eu não tenho nome.
Eu sou tão fresco quanto a brisa das montanhas. Eu não tenho paradeiro, eu sou as águas corredeiras.
Eu não tenho santuário como os deuses escuros nem estou no escuro dos templos profundos. Eu não tenho livros sagrados, nem sou eu bem cozido nas tradições.
Eu não sou o incenso montado nos altares mais altos, nem a pompa das cerimonias. Eu não sou, nem estou nas imagens gravadas, nem nos cantos ricos das vozes melodiosas.
Eu não estou atado, contido pelas teorias, nem corrompido pelas crenças. Eu não estou preso nas fronteiras das religiões, nem na agonia piedosa dos padres. Eu não estou atado pelas filosofias nem seguro no poder das seitas.
Eu não sou baixo nem alto. Eu sou aquele que reza e aquele para quem a reza é dirigida. Eu sou livre. A minha canção é a canção do rio, me chamando até os mares abertos.
Vagando, vagando... eu sou vida. Eu não tenho nome. E sou tão fresco quanto a brisa das montanhas.
Eu sou tão fresco quanto a brisa das montanhas. Eu não tenho paradeiro, eu sou as águas corredeiras.
Eu não tenho santuário como os deuses escuros nem estou no escuro dos templos profundos. Eu não tenho livros sagrados, nem sou eu bem cozido nas tradições.
Eu não sou o incenso montado nos altares mais altos, nem a pompa das cerimonias. Eu não sou, nem estou nas imagens gravadas, nem nos cantos ricos das vozes melodiosas.
Eu não estou atado, contido pelas teorias, nem corrompido pelas crenças. Eu não estou preso nas fronteiras das religiões, nem na agonia piedosa dos padres. Eu não estou atado pelas filosofias nem seguro no poder das seitas.
Eu não sou baixo nem alto. Eu sou aquele que reza e aquele para quem a reza é dirigida. Eu sou livre. A minha canção é a canção do rio, me chamando até os mares abertos.
Vagando, vagando... eu sou vida. Eu não tenho nome. E sou tão fresco quanto a brisa das montanhas.
As leis não fazem pessoas melhores, por Nasrudin
As leis não fazem com que as pessoas fiquem melhores — disse Nasrudin ao Rei. — Elas precisam, antes, praticar certas coisas de maneira a entrar em sintonia com a verdade interior, que se assemelha apenas levemente à verdade aparente.
O Rei, no entanto, decidiu que ele poderia, sim, fazer com que as pessoas observassem a verdade, que poderia fazê-las observar a autenticidade — e assim o faria.
O acesso a sua cidade dava-se através de uma ponte. Sobre ela, o Rei ordenou que fosse construída uma forca.
Quando os portões foram abertos, na alvorada do dia seguinte, o Chefe da Guarda estava a postos em frente de um pelotão para testar todos os que por ali passassem. Um edital fora imediatamente publicado: "Todos serão interrogados. Aquele que falar a verdade terá seu ingresso na cidade permitido. Caso mentir, será enforcado."
Nasrudin, na ponte entre alguns populares, deu um passo à frente e começou a cruzar a ponte.
- Onde o senhor pensa que vai? — perguntou o Chefe da Guarda.
- Estou a caminho da forca — respondeu Nasradin, calmamente.
- Não acredito no que está dizendo!
- Muito bem, se eu estiver mentindo, pode me enforcar.
- Mas se o enforcarmos por mentir, faremos com que aquilo que disse seja verdade!
- Isso mesmo - respondeu Nasrudin, sentindo-se vitorioso. — Agora vocês já sabem o que é a verdade: é apenas a sua verdade.
O Rei, no entanto, decidiu que ele poderia, sim, fazer com que as pessoas observassem a verdade, que poderia fazê-las observar a autenticidade — e assim o faria.
O acesso a sua cidade dava-se através de uma ponte. Sobre ela, o Rei ordenou que fosse construída uma forca.
Quando os portões foram abertos, na alvorada do dia seguinte, o Chefe da Guarda estava a postos em frente de um pelotão para testar todos os que por ali passassem. Um edital fora imediatamente publicado: "Todos serão interrogados. Aquele que falar a verdade terá seu ingresso na cidade permitido. Caso mentir, será enforcado."
Nasrudin, na ponte entre alguns populares, deu um passo à frente e começou a cruzar a ponte.
- Onde o senhor pensa que vai? — perguntou o Chefe da Guarda.
- Estou a caminho da forca — respondeu Nasradin, calmamente.
- Não acredito no que está dizendo!
- Muito bem, se eu estiver mentindo, pode me enforcar.
- Mas se o enforcarmos por mentir, faremos com que aquilo que disse seja verdade!
- Isso mesmo - respondeu Nasrudin, sentindo-se vitorioso. — Agora vocês já sabem o que é a verdade: é apenas a sua verdade.
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